4 de out. de 2009



"(…) gestos femininos bonitos sempre,
a delicadeza com que as mulheres
tocam nos objetos,
a harmonia dos dedos:
somos pesados e sem graça,
nós os homens, ao pé delas.
Pesados, brutos, canhestros:
não possuímos seja o que for
de ave ou de nuvem,
a nossa carne é densa e gaguejante.
Dá-me uma paz de eternidade
ver uma mulher numa casa,
o modo como o seu corpo
habita o espaço,
a forma como vestem,
de si mesmas, os compartimentos,
com um simples passo,
um simples olhar.
E depois uma espécie de
inocência primordial,
de leveza habitável:
devo ter sido muito feliz
na barriga da minha mãe,
por dentro da sua voz,
do seu sangue.”

António Lobo Antunes,
in “Eu, às vezes”

(Visão, Dez. 2007)

Um comentário:

Renata Domingues disse...

Aquilo que não se explica, simplesmente existe na presença feminina... que faz toda diferença de modo sutil, essencial ao coração! Lindo texto!

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